sábado, 20 de agosto de 2011

A Casa dos Budas Ditosos - Pecado Luxúria de João Ubaldo Ribeiro

A surpreendente historia da vida de uma senhora de 68 anos de idade que viveu plenamente a luxúria e ao mesmo tempo, um grande mistério, porque em verdade, não se sabe se ela realmente existe ou existiu. O autor diz que encontrou os originais em sua caixa postal, local onde estavam depositadas todas as orgias, peripécias e aventuras sexuais daquela senhora que provoca a libido e a imaginação de todos os leitores e leitoras.

O livro faz parte da coleção dos 7 pecados capitais: gula, ira, luxúria, inveja, preguiça, avareza, vaidade ou soberba. Cada um dos títulos representa um pecado tão grave que sobre estes não há perdão possível, segundo os ditames da igreja católica. A luxúria é classificada como pecado capital desde a idade média. Ao cometer um pecado capital, o cristão tem a sua alma condenada à danação eterna. Existem, ainda, duas outras categorias de pecados: os veniais e os mortais. Ambos são cometimentos, cuja pena é um castigo menor que a danação eterna. A Casa dos Budas Ditosos é uma história de luxúria gostosa e inteligente. A narrativa se alterna entre chocante, irônica, instigante e libidinosa, mesmo sem ser agressiva nem dissoluta. O João Ubaldo neste livro foi mais que excelente.

João Ubaldo Osório Pimentel Ribeiro, baiano de Itaparica, nasceu em 1941.
Escritor de nomeada e muito sucesso de bilheteria.
Além de ter recebido incontáveis prêmios literários brasileiros e estrangeiros é membro da Academia Brasileira de Letras.
Seus livros foram traduzidos para o alemão, dinamarquês, espanhol, francês, hebraico, inglês, italiano, iugoslavo e sueco.

Seus livros principais:

1 - A Vingança de Charles Tiburone
2 - Arte e Ciência de Roubar Galinha
3 - Livro de Histórias
4 - Miséria e Grandeza do Amor de Benedita
5 - O Conselheiro Come
6 - O Sorriso do Lagarto
7 - Política: Quem Manda, Por Que Manda, Como Manda
8 - Sargento Getulio
9 - Sempre aos Domingos
10 - Setembro Não Tem Sentido
11 - Vence Cavalo e o Outro Povo
12 - Vida e Paixão de Pandomar
13 - Vila Real
14 - Você Me Mata, Mãe Gentil


Trecho do Livro:

Isso pode resvalar para o saudosismo, os bons tempos e semelhantes asnices, não há bons tempos, só há tempos. Nada de saudosismo, saudosismo é uma espécie de masturbação sem verdadeiro prazer, uma inutilidade atravancadora, que no máximo pode ser empregada para brincadeiras, mas geralmente é perda de tempo mesmo. Nãoi, nada disso. Aqueles tempos tinham seu charme, mas eram duros também, cada tempo temn sua dureza, com mil perdões pela filosofia de botequim. Tomar nas coxas, de que eu já felei tanto, exige know-how, para ser desfrutado decentemente.

A mulher tem que treinar a postura, para estar segura de que vai atingir um orgasmo, ainda mais quando o homem é semi-adolescente e goza em dois décimos de segundo. Era preciso também tomar cuidado com o pessoal do "só a cabecinha", todo mundo manja esse pessoal, embora ele exista mais no folclore do que na vida real, eu mesma só encontrei uns três. Tive até vontade de dar para um deles, cheguei a começar a abrir as pernas, encostada no pára-lama do carro do pai dele. Mas algo me disse que não. Algo quase sempre mente, mas, mesmo assim, manda a boa paranóia sadia que se dê atenção a ele. Pois é, Algo me disse que não desse, nem nesse dia nem nos subseqüentes, embora adorasse me agarrar com esse rapaz, ele devia ter uns feromônios extraordinários. Ficava ralado de tanto botar nas minhas coxas e eu fazia tudo com ele, exceto deixar que ele metesse, fosse na frente, fosse atrás. Atrás, bem que eu tentei, a primeira vez em pé, encostada no muro do farol da Barra, que, aliás, é meio inclinadinho, e a gente fica mais ou menos reclinada de bruços, grande farol da Barra. Ele passou cuspe, eu me preparei toda ansiosa e, quando ele enfiou, não consigo imaginar dor pior do que aquela, uma dor como se tivessem me dado dezenas de punhaladas, uma dor funda e lacerante, que não passava nunca, me arrepio até hoje. E as tentativas posteriores foram todas desastrosíssimas, experiências humilhantes e acabrunhantes, passei anos traumatizada e decidida a tornar aquilo território perpetuamente proibido e mesmo execrado. Até que Norma Lúcia me ensinou uma coisa. Não. Duas coisas. Não. Três coisas. Primeira coisa: no começo, na iniciação, por assim dizer, tem que ser de quatro, requisito

absoluto para a grande maioria. Segunda coisa: tem que dizer a ele que venha devagar. Ou, melhor ainda, dizer a ele que espere a gente ir chegando de ré devagar, sempre devagar. Terceira e mais importante de todas: relaxar, relaxar, mas

relaxar de verdade, soltar os músculos, esperar de braços abertos, digamos. É um milagre. Foi um milagre, na primeira vez em que eu segui essa orientação simples. Daí para gozar analmente - não sei nem se é gozo propriamente anal, só sei que é um gozo intensíssimo - foi só mais um pouco de vivência, with a little help Eram my Eriends, ha-ha. Quem não sabe fazer isso nunca fez uma verdadeira suruba, nem pode fazer, nunca vai poder comer direito um casal, enfim, vai ser uma mulher incompleta, acho que qualquer um concorda com isso. Não sei se você sabe, mas as hetairas, as cortesãs da Grécia antiga, davam a bunda, preferencialmente. Apesar de já haver métodos anticoncepcionais, o mais seguro era mesmo uma enrabação, é uma arte milenar que não pode ser perdida, e toda mulher que, sob desculpas inaceitáveis e ditadas pela ignorância, preconceito ou incapacidade, não conta com isso em seu repertório permanente é uma limitada, não importa o que ela argumente. Acho até que todas as refratárias na verdade sabem que são limitadas e procuram negar essa condição através de mecanismos para mim pouco convincentes. Depois que aprendi, naturalmente que tive de procurar esse namorado meu esqueci o nome dele agora, Eusébio, qualquer coisa por aí e dar a bunda a ele, não podia morrer sem fazer isso. Dei numa festa de aniversário da então namorada dele, num sítio onde é hoje Lauro de Freitas, eu também era levadinha.

E por que eu não deixei que ele me comesse na frente também? Bem, primeiro porque achei que não estava pronta ainda, embora me sentisse profundamente lesada em meus direitos elementares, por não poder dar tudo o que era meu e de mais ninguém. Mas, para consolar, eu já tinha me desenvolvido extraordinariamente em outras áreas, já desfrutava tomar na bunda e nas coxas com grande competência, já gozava

chupando, gozava até quando chupavam meus peitos bem chupados, gozava no dedo, gozava apertando as coxas, não sentia, enfim, falta de muita coisa e tinha realmente terror de ficar grávida. Segundo, e mais relevante, é que eu tinha uma fantasia de meu desvirginamento, que eu acho que tirei da biblioteca de meu avô, um livro grossão sobre a vida sexual, que trazia as fotografias de um homem e uma mulher, ambos nus de frente, ambos em posição de sentido, tudo altamente neutro. Mas eu não conseguia deixar de mirar os peitos e os pentelhos dela e o bigode e o pau dele, passava horas entretida nisso e lendo a descrição de um desvirginamento, feita pelo autor. Não sei de cor, mas é como se soubesse, até hoje sou capaz de repetir essas palavras, do jeito que ficaram em minha cabeça: "E então chega o momento tão ansiado. Sem pronunciar uma palavra, ele fecha a boca da donzela com um beijo decidido entre seus bigodes másculos, insinua seus quadris, delicada mas firmemente, entre as coxas dela e dirige a glande inturgescente para o hímen, então trêmulo e lubrificado pelos fluidos naturais da vagina. Resoluto, ele se assegura, às vezes com a ajuda das mãos, de que está no ponto certo e então, enquanto ela dá um gemido abafado, entre a dor e o prazer da fêmea que finalmente cumpre o seu destino biológico, penetra-a com um só impulso vigoroso, abre-lhe mais as pernas, inicia um movimento de vai-e-vem profundo e, finalmente, derrama-lhe nas entranhas o morno líquido vital, sem o qual ele não é nada, ela não é nada." Essa era minha fantasia, até hoje é, sempre foi um dos meus temas de masturbação favoritos e, não sei se de alguma forma por isso, passei grande parte da vida preferindo homens mais velhos, só depois é que comecei a gostar de homens mais novos, depois que descobri que os mais velhos são putas velhas iguais a mim, não valem nada. E, depois, burro velho, capim novo, verdade inegável. Hoje, sinto prazer em seduzir e treinar um jovem bonito; é estimulante, revitalizador, faz bem ao ego.

Claro que eu, mesmo gostando irracionalmente da cena, ou seja, da maneira mais forte possível, não tinha idéia de que ia acontecer comigo exatamente dessa maneira, ou quase exatamente. Ainda nem sonhava em conhecer José Luís. José Luís foi meu professor de prática de Penal, ninguém ligava para ele, mas Penal é ótimo, porque tem aqueles papos de estupro presumido, sedução, atentado ao pudor, rapto etc., tudo excelente para puxar conversas de sacanagem aparentemente inocentes e técnicas, mas assim mesmo as meninas pouco ligavam para ele, não tinham intuição ou experiência para avaliar adequadamente o potencial dele. As poucas que se interessavam por ele não alimentavam planos, porque ele era casadíssimo, caxiíssimo, ordeiríssimo, reprovadoríssimo, de maneira que ninguém achava que valia a pena o trabalho, mesmo diante da tenebrosa escassez de homens aproveitáveis, aquele elenco deprimente de coçadores de baixios e primitivos neandertalescos. Parêntese. Falando em neandertalesco, me apareceu este parêntese, talvez injustiçando um pouco o homem de Neandertal. É difícil acreditar neste parêntese, mas é a pura verdade, não resisto a contá-lo. Verdade, verdade, fiquei pasma na ocasião e continuo abismada. Uma conhecida minha era noiva, de aliança no dedo, de um rapaz muito conhecido, com quem todo mundo simpatizava, um rechonchudinho corado, gentil, educado, aberto, simpático mesmo. Eles eram um casal de pombinhos, todo mundo se referia a eles como pombinhos, um chamego e um carinho que chamavam a atenção, só apareciam juntos, aos beijinhos e alisadinhas. Namoro padrão, na Bahia. Pois bem, pois um belo dia acabaram. Foi um susto geral, dezenas de hipóteses e especulações e ninguém conhecia a versão correta. Muitas e muitas voltas do mundo depois, nós duas estávamos tendo uma espécie de caso passageiro, e ela me contou, na cama, o que de fato havia acontecido. lnimaginável, mas acho que até hoje continua acontecendo. Ela me contou que mantinha a virgindade com ele, mas, de resto, faziam uma porção de coisas, na verdade, agora ela sabia, uma porção de meras perfumarias. E ele foi o primeiro na vida dela, a única experiência que ela tinha. E aí estão os dois namorando numa balaustrada deserta na Barra, já escurecendo, ele sentado, ela em pé, recostada entre as pernas dele, quando sentiu o pau dele duro lhe roçar na bochecha. Ela então ficou esfregando a cara para lá e para cá, por cima do pano da calça. E então, me contou ela, que não tinha razão nenhuma para mentir e parecia até estar precisando daquele desabafo, ela foi seguindo um curso natural, sem nem pensar no que estava fazendo. Abriu a braguilha dele e deixou que o pau pulasse fora. Era a primeira vez que o via assim, cara a cara, e ficou quase hipnotizada, se sentindo como nunca se sentira antes, uma falta de fôlego, uma ânsia, uma vontade de agarrar tudo de uma vez, as costas fibrilando de alto a baixo. Daí para pôr o pau dele na boca foi um instante e aí acabou o namoro. Ele de repente empurrou a cabeça para trás e deu um murro nela. Não um tapa, disse ela, mas um murro que lhe deixou o queixo roxo. Que era que ela estava pensando? Em que puteiro aprendera aquilo? Achava que mulher dele era para fazer aquela coisa nojenta, própria,das mais baixas prostitutas? Se ele quisesse aquilo, ia procurar uma vagabunda na rua, não sua própria mulher. E que desenvoltura era aquela, onde ela havia aprendido aquilo, com quem já fizera aquilo? Nunca mais a beijaria na boca, não queria chupar homem nenhum por tabela. Casaria com ela, sim, porque já estavam comprometidos, mas nunca mais a beijaria na boca. Ela, que tinha caráter, decidiu que acabaria tudo naquela mesma hora. Na ocasião, não conseguiu dar a descompostura nele que pretendia, mas nunca mais quis saber dele, mesmo quando ele tomou corno de uma outra namorada e veio atrás dela no proverbial rastejar, mordido de arrependimento.

Então você vê. Não só os homens tinham medo de deflorar as moças, mesmo quando elas imploravam, como ainda existia esse tipo de selvageria. Era crucial ser uma navegadora hábil, nesse mar de babaquice, cheio de armadilhas inesperadas. Mas eu sempre tive um faro superior, uma capacidade de percepção mais aguçada que o comum, talvez. Talento, por que não? Por exemplo, descobri o potencial de Zé Luís num estalo, foi repentino mesmo. Eu estava no saguão da faculdade, quando me veio um clarão, clarão é a única palavra apropriada. Mas... Mas estava na cara! Zé Luís, Zé Luís ali dando sopa, e ninguém à altura de aproveitar. E então ele subiu a escada sem me olhar, mas eu sabia que ele estava me vendo e então eu falei comigo mesma que Deus é grande e tudo estava maravilhosamente às ordens, a vida é simples e a gente não repara. Cego é mesmo o que não quer ver e agora eu vou contar La grande sédution.