sexta-feira, 15 de abril de 2011

Livro: Pornopopéia de Reinaldo Moraes

Livro bom é assim. Faz – ou não – sucesso. Se não faz, não adianta nada colocar na mídia, escrever em blog, twiter ou orkut. Se fizer, faz e ponto. Assim é Pornopopéia. O nome que o autor adotou é uma mistura de pornografia com prosopopéia. E assim é o livro de Reinaldo Moraes. Não é uma história beatnick, que pudesse ter surgido pela influência de Kerouac, aquele do “On de The Road”. Pelo contrário, o personagem central é Zeca. Nada mais prosaico que alguém se chamar Zeca, mesmo em se tratando de um personagem que é um ex-roteirista e assina o filme Holisticofrenia. Zeca não busca a transformação da humanidade, das pessoas que vivem à sua volta, nem de ninguém. Ele quer – e pratica – sexo com muita droga e mais nada. É assim. Só vive o mágico agora, sem se importar com o que passou ontem e o que virá amanhã. Num certo sentido Pornopopéia é uma crônica – ácida, mas real – da vida underground paulistana. A linguagem é chula sim, mas muito bem elaborada, inventiva e recheada de um finíssimo humor. Pornopopéia é visceral e diametralmente oposto ao livro da Bruna Surfistinha, mas ao longo da leitura, tamanha é a devassidão que não há como não comparar os dois livros. A novela em que se transforma a encomenda de um pequeno filme institucional sobre embutidos de frango é coisa de escritor divertido e muito bom de imaginação: puro talento. Pornopopéia não é literatura marginal, embora machista, politicamente incorreta e socialmente desajustada. O final é muito bom.

Autor Reinaldo Moraes
Guarde o nome Reinaldo Moraes. Ele é escritor e não apenas autor. Reinaldo Moraes apresentou-se no primeiro dia da Flip, numa mesa chamada “Fabulas Contemporâneas” juntamente com Ronaldo Correia Brito e Beatriz Bracher. Reinaldo se destacou. Muito. Não só comprei o seu livro Pornopopéia como entrei na fila de autógrafos. Se você não é íntimo do autor, eu acho que entrar em fila para autógrafo é coisa trouxa e tosca. Só que desta vez não resisti. Ele escreveu “Pro Márcio, um grande abraço do Reinaldo Moraes”. Fotografei o autor na mesa dos autógrafos e postei no site Livronautas. Descobrir Reinaldo Moraes é uma grande dica e uma nova experiência literária com nome e sobrenome. Pornopopéia é a história de um ex-cineasta marginal, paulistano, de nome Zeca. Roteirista frustrado, Zeca também criava, por razões financeiras, roteiros para filmes de publicidade. Suas aventuras ou desventura pelos subterrâneos da noite paulista é contada pelo Reinaldo Moraes, com muito talento, mas também, com muita devassidão, regada a muita droga, muito sexo, pouco dinheiro, e pouco rock-on-roll. Livro ótimo foi conceito atribuído ao Pornopopéia. Leitura muito boa.

Trecho: Acordei daquele sonecão pós-peixada nadando em suor, com uma vaga dor de cabeça e soltando petardos genocidas. Meu corpo sozinho me levou ao mar. Eu já tinha dado duas nadadas antes do almoço, a primeira de uma hora singrando as águas piscinosas do Pontal, pra além da arrebentação forte que tem lá, numa trajetória mais ou menos paralela à praia. A segunda tinha sido ali mesmo, na frente da Chapéu-de-sol. Mas nada como um mar depois do outro. Nadei e boiei de papo pro ar, abandonado àquela momidão placentária, no embalo das vagas, mirando um céu que já tinha sido bem mais azul de manhã. Me sentia pleno - pleno de peixe, camarão, cerveja e cachaça. Tive também uma aguda urgência urinária e dei uma bela mijada dentro d'água. Da água vieste, à água retomarás. Sentia os músculos ainda repuxentos da natação matinal, mas depois de alguns minutos me bateu um repentino ânimo olímpico e desatei em braçadas enérgicas mar adentro como se fugisse da bocarra de um tubarão ou fosse ao encontro duma sereia a me acenar do fundo da enseada. Quando dei por mim, tava eu lá no fundão, longe da praia.

Logo ficou claro que eu devia era ter ficado ali pelo rasinho mesmo, boiando ao sabor das marolas refrescantes, esquecido da vida. É isso que eu devia ter feito. Quando vi, porém, já tinha ultrapassado a raia imaginária onde eu tinha nadado pela manhã, a uns cem metros da rebentação, talvez duzentos, sei lá, é difícil calcular distâncias no mar, o metro ali flutua, cresce, encurta, dança e serpenteia ao sabor das vagas, e, se você embarca numa correnteza rumo ao mar aberto, acabam sobrando muitos metros debaixo do seu metro. Eu devia ter voltado assim que cheguei ao fundão. Em vez disso, e para me convencer de que eu poderia nadar até o fim do mundo, dei mais umas vigorosas braçadas em direção à Àfrica ocidental. Comecei, então, a me esbodegar pra valer. Aí parei. Parei, boiei, respirei e logo constatei que a correnteza me arrastava pra direita, pra depois do Pontal, ou seja, pro "mar de fora", como eles dizem aqui. Um pouco mais, estaria fora do âmbito da enseada de Porangatuba, bem longe da terra. Achei melhor me livrar logo daquela correnteza-expresso a caminho de Cabo Verde e sentei os braços no mar de novo pra retomar. Só que o caminho de volta no mar é sempre mais longo que o de ida, se você não é uma tartaruga marinha. Logo vi que não ia ser fácil a empreitada. Estava exausto. As braçadas de crawl me saíam cada vez mais fracas e eram ignoradas pela correnteza, que continuava me arrastando pra casa do caralho de Netuno. Tava na cara que eu ia precisar de mais força que aquilo pra me tracionar na água. Se eu parasse pra boiar e relaxar, ia ser arrastado pra longe e acabar danndo uma cabeçada num petroleiro em alto-mar. Tentei compensar a tibieza dos braços com umas pernadas vigorosas. Tão vigorosas que - CRAU! Cãimbra. Puta cãimbra do caralho. Soltei um berro ouvido apenas pelos vagalhões que me cercavam de todos os lados, abutres líqüidos rodeando a carniça extenuada.

Mais informações sobre esse livro e o autor acesse nossa página: http://www.livronautas.com.br/

Nenhum comentário:

Postar um comentário